O Inicio - Meu sonho não tem fim

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Lembro-me como se fosse hoje, eu tinha dezesseis anos e caminhava juntamente com dois colegas de trabalho, adolescentes como eu na época, pela Rua Direita no centro de São Paulo, em direção a um dos cinemas próximos ao Vale do Anhangabaú, que há muito tempo já não existe mais. Eu estava muito feliz, pois era o primeiro mês de meu primeiro emprego… tinha acabado de receber o meu primeiro salário.

 

Foi quando me deparei, na esquina da Rua Direita com a Rua Quintino Bocaiúva, com aquela imagem que mudaria minha vida, assim como, a forma como eu encararia, a partir daquele dia, os problemas, as dores e tristezas de meu semelhante. Sentada, em um pequeno caixote de madeira, uma pequena senhora, certamente com mais de 80 anos, frágil, distante, com um olhar extremamente triste, pedindo esmolas. Aquela cena passou por mim em câmera lenta e enquanto eu observava aquele ser indefeso, via a minha volta as pessoas passarem rápido por aquele triste cenário, corriqueiro para a grande maioria.

 

Meus colegas conversavam alegremente e eu - em minha inocência juvenil - me perguntava, o que uma senhora como aquela fazia ali, na fase final de sua vida, quando deveria estar descansando, tendo uma boa alimentação, cuidados médicos e um lar decente, depois de uma longa caminhada de mais de oito décadas. No entanto, ao contrário, estava ali, pedindo esmolas para sobreviver por mais um dia. De imediato, surgiram em minha mente muitos questionamentos: Onde morava? Não tinha parentes? Como sobrevivia com tamanha fragilidade a tantas agruras? A cada questionamento a dor em meu peito aumentava. Aquela dor silenciosa, de se sentir muito pequeno ao lembrar de todas as vezes que reclamei de uma camisa que não estava passada, de ser acordado pelo latido do meu cachorro, de um ônibus perdido, de uma garoa fria ao amanhecer, de um café com leite com pouco açúcar...

 

Naquele momento, meus amigos já me aguardavam surpresos com meu "estado de transe". Fui até aquela senhora e dei-lhe o dinheiro que tinha em minha carteira, mas, aquilo não resolveria o seu problema, apenas anestesiaria, por um ou dois dias, seu sofrimento e suas limitações. Assim que me virei, chorei copiosamente e meu passeio terminou naquele momento. Despedi-me de meus amigos e retornei à minha casa, imaginando no trajeto de volta ao meu lar, como seriam os dias daquela frágil senhora e de tantas outras, assim como, de tantos outros frágeis senhores, crianças, mães solteiras, animais abandonados e todos os nossos irmãos menos favorecidos, abandonados e infelizes, que há muito tempo já tornaram-se parte da paisagem para a maioria de nós. Aquela pequena senhora não poderia imaginar o quanto mudaria minha vida, o quanto seria importante para o surgimento desta organização.

 

Durante aproximadamente dez anos, realizei alguns trabalhos de assistencialismo, no entanto, com o passar do tempo percebi que minha paixão, minha missão e talvez o meu dom, estavam na conscientização e na motivação e este se tornou mais um de meus sonhos, o de criar uma organização que trabalhasse, basicamente, conscientizando e motivando as pessoas. A concretização deste sonho teve início em 1997, com uma pequena homenagem aos inesquecíveis Martin Luther King e Ayrton Senna da Silva, e que gerou posteriormente o primeiro projeto social.

 

O resto desta história, você poderá conferir nas páginas deste site, tendo a certeza de que em cada uma delas, estará presente um pouquinho daquela "pequena senhora da Rua Direita". Que possamos refletir com sua história de vida, assim como, de tantos outros de nossos irmãos excluídos, esquecidos e infelizes. Uma situação que, infelizmente, em diversas ocasiões, como a dessa pequena senhora passa desapercebida, pois, muitas vezes a triste realidade de nossos semelhantes é uma tragédia a conta-gotas, dispersa, silenciosa, escondida desde os humildes rincões e majestosas fazendas das áreas rurais, até as periferias e condomínios de luxo das grandes cidades. Fica lá, tão escondida e esquecida, que aqueles que têm condições dignas de sobrevivência, liberdade, paz e principalmente, são felizes, não enxergam seus irmãos famintos, enclausurados e infelizes. Para muitos de nós, estes males se transformaram em números, estatísticas, como se não trouxessem juntos histórias, nomes e seus dramas.

 

Agora é o tempo para transformarmos em realidade nossas promessas de melhorarmos como seres humanos e filhos de Deus, de subirmos do vale das trevas da intolerância, injustiça e indiferença para com nosso semelhante ao caminho iluminado pelo sol da justiça, compreensão, bondade e fraternidade. Enquanto você lê este texto, o mundo contabiliza mais algumas centenas de mortes, vítimas da fome, da pobreza, da opressão e da infelicidade. Para muitas famílias mais um luto, mais uma perda irreparável, para nós, como humanidade, um pouco mais de nosso maior tesouro se perdendo, pela indiferença, ganância e crueldade dos mais poderosos e abastados, e principalmente, pela conformidade e descaso da maioria de nós, pois, como já dizia o saudoso e inesquecível Martin Luther King, "nós não lamentamos tanto os crimes dos perversos, quanto o estarrecedor silêncio dos bondosos".

 

 
 
 
 
 

 


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